O que é ser índio no Brasil?
Mesmo após séculos da colonização brasileira, a população indígena continua sofrendo violências e perseguições
Foi no século XVI que os portugueses chegaram ao Brasil e estabeleceram seu primeiro contato com os habitantes que já moravam aqui, que além de difícil e conflitante, trouxe para os índios mortes, perseguições e doenças. Mesmo com o passar de quatrocentos anos, os indígenas brasileiros continuam sendo negligenciados e mortos por um Estado que não parece se importar com sua luta. E, embora sejam silenciados, eles continuam a resistir e reivindicar seus direitos.
Em 27 de abril de 2017, cerca de 4 mil indígenas se reuniram dos dois lados da Esplanada dos Ministérios com o intuito de protestar a favor de seus direitos e de suas vidas. Nesse protesto, foi deixado um recado para os Três Poderes: uma crítica sobre a identificação, demarcação e proteção das terras indígenas ao governo Temer. Um exemplo mais recente dessa resistência aconteceu em agosto deste mesmo ano, quando a delegação de Guarani e Kaiowá, junto com outros povos indígenas, participaram de uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM). A participação na reunião tinha como foco debater as recomendações recebidas pelo Brasil pela ONU.
Um dos maiores problemas para comunidade indígena é a tese do marco temporal. Segundo a tese, só podem ser consideradas Terras Indígenas aquelas que tiverem comprovação de posse em outubro de 1988, ano da Constituição. Outras dificuldades enfrentadas pela população é a paralisação da demarcação de terras desde 2016, o enfraquecimento de instituições públicas como a FUNAI e a proposição de leis anti-indígenas.
Foto: Fábio Nascimento. Reprodução/Mobilização Nacional Indígena
Apesar de todos os problemas e manifestos já citados, pouco se sabe sobre a causa indígena e os índios. Isso se deve ao fato de que para o senso comum, o indígena no Brasil é ligado a um ideal de folclore e colonização. Esse pensamento além de preconceituoso, afasta cada vez mais os índios da sociedade, o que leva a uma carência de divulgação nas mídias.
Existem no Brasil 305 culturas indígenas, mais de 800 mil pessoas que são diversas entre si, e, ao longo do tempo, foram incorporando elementos de culturas não indígenas. Essa incorporação levanta o questionamento preconceituoso: o que é ser índio atualmente? A ONG Instituto Socioambiental lançou uma campanha com um vídeo de provocação àqueles que compreendem que para ser índio deve-se viver exatamente como os antepassados viviam. No vídeo, a instituição levanta o seguinte questionamento: “por que o homem branco pode mudar e ainda ser homem branco, mas o índio não pode mudar e continuar sendo índio?”
O antropólogo Renato Sztutman, em uma entrevista para o NexoJornal, afirma que o jeito que o Ocidente encontrou para “amar” os índios foi mantendo-os no passado e não reconhecendo sua mudança e presença na sociedade atual. Ou seja, os antigos indígenas são reconhecidos, admirados e respeitados. Entretanto, os indígenas atuais, a partir do momento que se levantaram e passaram a reivindicar suas terras e seu direito de se integrar na sociedade, passam a ser chamados de impostores, “falsos índios” por usarem roupas e possuírem televisão, além de serem chamados de ladrões de terras por latifundiários. A ideia de que uma etnia deve se manter a mesma, imutável, não evoluir junto com a sociedade e nem ao menos fazer parte dela é violenta e se assemelha muito ao ideal do apartheid.
Mesmo possuindo palavras vindas do vocabulário indígena, como “Ipanema” e “Morumbi”, a sociedade brasileira tem dificuldade em aceitar a influência desses povos em nossa cultura, mantendo-os sempre afastados em um ideal ultrapassado.
Foto: Isabel Harari. Reprodução/Mobilização Nacional Indígena
Ser índio em um Estado onde tal etnia é generalizada, estereotipada e entendida como incapaz de crescer, é viver em constante situação de luta e resistência, é não poder visualizar um futuro acadêmico ou profissional sem ser vítima de racismo e, acima de tudo, é ter que lutar para ter as terras que sempre foram suas.
Para mais informações sobre a luta indígena, clique aqui.