Faculdade é coisa de preto?
A inscrição de negros em universidades carrega consigo casos de racismo e discriminação institucional
Com o elevado nível de desemprego no país, torna-se cada vez mais necessário ter estudos e especializações para preencher os currículos, mas se há algo que dificulta ainda mais na conquista de tão almejada vaga de emprego é a cor de pele daquele que busca um trabalho.
Essa dificuldade inicia-se mesmo dentro da faculdade, na qual apenas 35% dos matriculados em cursos de graduação no Brasil são negros ou pardos. No Sul são apenas 10% e no Sudeste 27%, segundo levantamento do Inep em 2012.
Segregação estrutural ocorrida nas instituições de ensino. Acima, uma obra que critica o racismo e seu impacto no corpo de mulheres negras. Foto por Rás Akanni, via Mundo Negro
Assim, com a entrada dos negros em ambientes que sempre foram historicamente de brancos, como os cursos de graduação, há o choque e o preconceito como consequências evidentes nas instituições de ensino, e exemplos práticos não faltam para comprovar as estatísticas.
Em 2016, um professor de psicologia da UFG foi expulso sob gritos de “racista”, pois de acordo com o Centro Acadêmico de Psicologia da Universidade Federal de Goiás, o docente falou que determinados ingressantes não sabiam realizar as operações básicas da matemática, associando isso às políticas de ações afirmativas. Ao criticar explicitamente o programa de cotas raciais, atribuiu a elas a culpa de tal conjuntura.
A Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) investigou em 2017 atos de racismo sofrido por um estudante do 4º ano que participava como atleta da Intermed, uma competição entre escolas de medicina, em que membros da torcida da PUC Sorocaba disseram ao aluno “Olha a sua cor, você é negro, e com certeza passou por cotas”.
Em 2018, um aluno de administração de empresas da FGV-SP chamou um estudante de “escravo” na legenda de uma foto divulgada em um grupo de WhatsApp. Já na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, uma porta do banheiro feminino fora marcada com as frases “fora preta sapatão”, “odeio preto” e “fim das cotas”, sendo esse o terceiro acontecimento parecido na instituição.
Protesto que reivindica o espaço universitário para a população preta. Foto: Reprodução/Revista RET
A cada cinco dias registra-se um caso de injúria racial nas faculdades paulistas, de acordo com dados da Secretaria Estadual da Segurança Pública de São Paulo reunidos pela GloboNews. Na mesma notícia publicada pelo G1, o professor de direito do Instituto Luiz Gama, Silvio Almeida, afirma que os números revelam o “aspecto estrutural” do racismo. “Racismo dá o tom de normalidade das instituições e da vida social em uma sociedade desigual. Os números não surpreendem porque o Brasil historicamente foi constituído dessa maneira”, explica o acadêmico.
Nesse cenário é preciso cada vez mais discutir e debater sobre temas raciais, tendo eventos culturais e informações para tornar a população negra visível diante de um histórico que sempre a deixou à margem da sociedade. Não é mais possível tolerar ações de racismo em instituições de ensino, que devem formar indivíduos que respeitem a dignidade da pessoa humana.